Em
não menos de duas ocasiões, o ilustre professor Eugenio Zaffaroni
fez questão de abordar os grandes malefícios que uma mídia de
pouca qualidade gera em uma democracia fragilizada, principalmente na
América Latina. E após fazer uma análise sobre as grades de
programações dos canais de televisões abertas, sinto-me obrigado a
acreditar que no caso do Brasil, essa realidade seja ainda mais
drástica. Pois se o cidadão não possuir condições de arcar com
uma “tv paga”, certamente ele será refém daquilo que há de
mais bizarro, poluidor, deprimente e desencorajador. Porquanto ao
avaliar canal por canal, grade por grade, salvo raríssimas e
duvidosas vezes, quando conseguimos encontrar algo com a “fumaça
de boa notícia”, ao final percebemos que ela na verdade possui um
intuito tendencioso ou partidário. E pior, aquele que está diante
de um microfone, profissionalmente falando, por vezes se esquece de
seu dever de transmissor imparcial de notícias e informações para
usá-lo de forma a convocar e disseminar ideologias ou resolver
problemas pessoais.
Falas
agressivas e desnecessárias, arrogância, intolerância, informação
manipulada, festivais de programas que de muito colocam a mulher
abaixo da condição de fruta ou objeto, programas de auditório
recheados com o que há de mais sensacionalista, “jornalistas”
que insistem a querer moldar um pensamento coletivo quanto a
problemática da criminalidade de que “quanto mais prender
melhor”, isso tudo desprezando qualquer necessidade de
implementação de políticas sociais efetivas.
Se
pararmos para observar, até em programas que o foco deveria ser
seriedade, oportunidade de transmissão de informação relevante,
dedica-se em média 20% do tempo para o fútil, 30% para o
irrelevante, 40 para retratar o ódio / violência (sem no entanto,
entrar no mérito das causas) e apenas 10% para algo que realmente
alerte, ensine e oriente. Tudo obviamente com o intuito de investir
no processo de imbecilização do cidadão. Sem contar a propaganda
querendo estimular a um consumo a “qualquer preço”.
E
pior, o povo parece gostar, discute de forma voraz quando o assunto é
futebol, bbb ou novela, mas quando o assunto é política, prefere o
argumento de que “política não se discute”. Esquecem que é
debatendo e discutindo que ideias novas surgem. Basta analisarmos as
redes sociais, caso alguém poste fotos seminuas de belos corpos,
alguma imagem de celebridades em situações polêmicas (e que
ninguém tem nada a ver com isso, diga-se de passagem) ou um beijo
gay em uma novela, para isso ser suficiente a despertar milhares de
curtidas ou compartilhamentos. Chegamos ao ponto de sermos capaz de
curtir fotos e imagens em que grupos terroristas decapitam,
incendeiam ou afogam inimigos. E ainda há quem pergunte o porquê de
os radicais do EI rotineiramente fazerem questão de cometer tais
atrocidades e filmar. A resposta é simples: há quem curta,
compartilhe, divulgue, sem perceber que estão fazendo exatamente o
que esses radicais querem.
O
fato é que o Brasil para mudar não adiantará apenas uma renovação
política, precisará haver uma mudança de paradigma, em que a
prioridade seja a conjugação dos verbos no plural e não no
singular, em que o discurso seja de união e não de segregação,
que as diferenças sejam respeitas pois todos somos diferentes e
iguais ao mesmo tempo. É preciso desconstruir a ideia de que são os
políticos que mudarão nossa realidade social. Todos precisamos
fazer a nossa parte.